segunda-feira, 30 de junho de 2008

Os movimentos sociais e a democracia brasileira: Uma resposta à tentativa anti-republicana de erradicar o MST




Na definição ocidental, o Estado democrático é aquele em que existe exercício pleno de eleições livres e diretas, liberdade de imprensa e pleno Estado de direito. Devemos exercitar a transcendência e superar a forma democracia apenas no campo jurídico ou político institucional, passando a pensar no Estado democrático também no campo do econômico.
O acesso às riquezas naturais e aos bens e serviços produzidos por um país deveria entrar na equação que “mede” o nível de democracia. Uma democracia sólida, inevitavelmente, possuirá uma riqueza democratizada. Por isso, é fundamental inventar uma equação que agregue questões como o acesso ao poder político e, ao mesmo tempo, dê conta da relação da riqueza produzida e da sua distribuição. Paralelo a isto, é importante definir como um princípio republicano, índices de produtividade nos diversos espaços de produção do país, afinal de contas, a produção de riqueza deverá favorecer a todos os cidadãos, sem exceção de classe, etnia ou gênero.
A partir da divisão dos poderes harmônicos (Montesquieu em O Espírito das leis) surgirá a idéia de equílibrio entre os poderes do Estado Republicano e Democrático, surgindo a lógica do "Sistema de Freios e Contrapesos". Apenas o poder poderá frear o poder, anulando a possibilidade do abuso de poder ou da tirania. Outra referência de nosso Estado Democrático e Republicano é a teoria do Contrato Social de Rousseau e sua idéia de vontade geral. Enfim, um pouco da epistemologia de nosso Estado, pautado pelo direito romano, pela filosofia grega e pela ética judaica.
A derrubada do Antigo Regime criou o Estado Democrático e a economia mercantil-capitalista. A divisão social do trabalho produziu um homem cindido entre possuidores de capital e possuidores de sua força de trabalho.
O Estado Democrático e Republicano, de alguma maneira, surgiu como a expressão de interesses inconciliáveis entre os possuidores de capital – senhores do lucro – e aqueles que recebem o salário, trabalhadores livres do meio de produção. Este conflito distributivo, esta incessante luta de classes é amortecida e escamoteada pela democracia liberal, o Estado Democrático trasnformou a vontade geral de Rousseau em vontade específica do capital. O "Sistema de Freios e Contrapesos" é uma engrenagem jurídica articulada para manter intacto a ordem e o progresso do status quo, na prática é algo parecido com o equílibrio de Pareto (ponto de máxima na manutenção do atual estado de coisas), achar um ponto de equílibrio que maximize a alocação dos recursos sem alterar o status quo. Ou encontrar um ponto que aparentemente todos são iguais perante as leis, porém, perante as leis que estabelecem como limite do direito do trabalho a sacrosanta propriedade privada.
O Brasil é a única democracia moderna que não passou por um processo de reestruturação fundiária – Reforma Agrária. Temos quase 500 anos de profunda contradição no campo: o alto desenvolvimento tecnológico do agro-negócio convivendo com a miséria do trabalhador do campo. Isto sem considerarmos o papel antinacional de nosso agronegócio, que transforma nossa economia em um frágil refém da dinâmica de acumulação do resto do mundo: o mundo vai bem, nossa economia vai bem; um abalo na economia mundial, um terremoto em nossa economia.
O MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra) cumpre o papel de agente da democracia e protagonista da republicanização da questão agrária no Brasil. Os movimentos sociais no Brasil possuem um papel protagonista na construção de nossa democracia e o MST, desde sua fundação, articula desejo democrático e vontade de justiça social em sua base social. O MST é o despertar de Milhões de homens e mulheres para a vida política e a prática cidadã.
O conselho superior do Ministério Público do Rio Grande do Sul aprovou um relatório que pede a extinção do MST. Este relatório fere a democracia e diminui o espírito republicano de nosso país. Um dos responsáveis pelo relatório (o promotor Gilberto Thums) afirma: "Voto no sentido de designar uma equipe de promotores de Justiça para promover ação civil pública com vistas à dissolução do MST e a declaração de sua ilegalidade". Hoje o MST, grande propagandeador do espírito democrático no campo, contribui na criação de escolas, cooperativas e assessorias técnicas para os pequenos produtores e postos de saúde. Sofre uma perseguição que atenta contra a democracia brasileira. Este processo simboliza o Brasil da desigualdade social, o Brasil do latifúndio, o Brasil do atraso. Atacar o MST é atacar a liberdade de organização da sociedade civil brasileira.
Este relatório não busca apenas a extinção de um movimento social, mas a supressão das conquistas do povo do campo e pretende garantir a continuidade de um Brasil antigo e comprometido com um projeto excludente, antipopular e antinacional. Thums declara ainda: "Nós conseguimos, com a ajuda da Polícia Militar, identificar todos [os militantes do MST]" – com uma atitude típica de um Estado de exceção, esta declaração nos lembra o período triste da ditadura militar brasileira.
A população brasileira deve assumir as bandeiras democráticas e exigir um novo índice de produtividade no campo. A terra é uma questão de soberania, visto que o acesso à ela garante um passo importante no sentido da busca da superação do subdesenvolvimento brasileiro. Não podemos aceitar a terra como um ativo de especulação imobiliária enquanto milhões de homens e mulheres não possuírem o acesso à terra. A reforma agrária garantirá uma distribuição equitativa da população brasileira, evitando o exôdo rural, contribuindo com a erradicação da miséria no campo e melhorando a qualidade de vida do trabalhador do campo e da cidade.
O elitista e antidemocrático conselho superior do Ministério Público do Rio Grande do Sul deve, antes de exigir o fim do MST, deve exigir o fim do latifúndio. Antes de colocar movimentos sociais na ilegalidade, deve colocar a miséria como ilegal. Este é um triste exemplo da metamorfose da vontade geral em vontade específica do latifúndio e do capital. O limite do direito de organização do trabalhador brasileiro é o marco da propriedade privada e da acumulação privada.
Nem mesmo o massacre de Eldorado dos Carajás foi tão ignóbil e criminoso como esta medida antidemocrática e anti-republicana. Pela democracia e pela vida, Blog do SE está com o MST!

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